sábado, 14 de fevereiro de 2009

Would You Be My Valentine?


Alas, that love, whose view is muffled still,
Should, without eyes, see pathways to his will!

(Shakespeare´s Romeo and Juliet - Act I, Scene I)



Manhã de domingo. Na rua, um termômetro marca 17°F. O vento frio deixa o rosto avermelhado. O sol clareia, ofusca, mas não aquece. Saí da 8th Ave e estou caminhando na 49th St em direção a 5th Ave. Não prestava atenção a muita coisa. Estou fixo no meu destino, que era visitar a Catedral de St. Patrick.

Atravesso a 7th Ave, a Broadway Ave, a Ave of Americas. Por fim, chego a 5th Ave e dobro a esquerda. Começo a observar que as vitrines das lojas tinham uma predominância de um vermelho intenso. Vinhos, chocolates, flores, cartões, sugestões diversas de presentes românticos e até mais geek como laptops com fita vermelha e laço. Lá estava o sistema se passando por sentimental para se alimentar mais.

Era Valentine´s Day! A constatação lembrava-me vagamente de uma história que tinha lido algum tempo atrás. Um imperador romano, Claudius II, percebera que homens solteiros eram melhores soldados do que os casados. Por isso, decidiu proibir o matrimônio de jovens. Um religioso, Valetim, considerava injusto o decreto e continuou a realizar, em segredo, os casamentos de jovens apaixonados. Claudius, insatisfeito, ordenou a morte de Valetim, que provavelmente ocorrera em um 14 de fevereiro. Assim, o dia de São Valetim ficou sendo o dia dos namorados em diversos países.

No Brasil, sobre o 12 de junho já tinha ouvido duas explicações. Primeiro, que a data é véspera do dia de Santo Antônio, o santo casamenteiro. Segundo, que os comerciantes não queriam a data em fevereiro por causa da proximidade do carnaval, que é um período de boas vendas. Mas no fundo, penso, carnaval é mais peito e bunda de fora do que troca de presentes de casais apaixonados.

Distraído com esses pensamentos que me acompanhavam na caminhada, imaginei que estaria perto do meu destino. Foi então que, do outro lado da avenida, contemplei uma das construções mais maravilhosas que já tinha visto. As duas torres da Catedral de Saint Patrick me deixam admirado, literalmente boquiaberto. Atravesso a avenida e circundo toda a igreja, tentando absorver e deixar gravado na mente cada detalhe da arquitetura. Uma construção impressionante que ocupava uma quadra inteira.

No interior, observo as colunas e arcos, tudo extremamente grandioso. Proposital, pensava. Para que, simbolicamente, as pessoas se sentissem pequenas diante do mistério da criação. Por ser dia dos namorados, não poderia deixar de pensar na realização de um casamento naquela igreja. Não, não me imaginava casando. O que eu imaginava é que eu pudesse assistir à realização de um matrimônio em um local tão bonito. Provavelmente, era o Valentine´s Day influenciando meu pensamento.

Saí da igreja para continuar minha caminhada e visitar outros lugares. Em uma vitrine, em um cartão gigantesco, havia os dizeres:

Would you be my valentine?

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Faltou Um Estampido

Estrada de chão. Barro e pedregulho. No caminho, vegetação mista, algo entre o agreste e o sertão. Comecei a reconhecer alguns pontos. Estava perto da logoa, onde estavam todos. Talvez tenha me afastado demais a pé, pensei.

Era possível ver ao longe uma ou outra casa. Casas de taipa. Em algumas, estava visível a armação de varas na qual é socado o barro. Sentia o calor queimando o rosto mesmo quando passava pela sombra de uma ou outra árvore de beira de estrada.

Ouço o barulho de pneus. Olho para trás e vejo a nuvem de poeira que se aproxima. Como se não bastasse o calor, penso, agora vou comer muita poeira.

O carro para ao meu lado. Imagino que vai pedir informações. Não conheço bem o local e meu GPS tinha ficado no acampamento. O vidro lateral baixa suavemente. Sinto o ar frio do ar condicionado que escapa e consegue me atingir. Não sou bom em identificar modelos de automóveis...

- Quer uma carona?

O suor que já estava no rosto por causa do calor mistura-se a outro que acabara de chegar. Sensação de extremo alerta percorria o corpo. Estresse. Havia algo errado. Se era apenas uma falsa intuição, não sei. Pronto para recusar, pergunto:

- Para onde está indo?

A resposta confirma que não era louco meu pressentimento:

- Para onde você quiser.

O pensamento é tão rápido. Para descrevê-lo, no entanto, gastamos tanto tempo e, ainda assim, não fica bem descrito. Um sensação que era uma mistura de irritação e pena. Era um homem de meia idade na direção do veículo e eu um rapaz de 19 anos que tinha saído com um grupo de amigos, todos de moto, para acampar à beira de uma lagoa. Como as pessoas se arriscam, eu raciocinava. Pegam qualquer um em uma beira de estrada, sem saber se tem uma arma ou o que poderia fazer. Ou alguém pega uma carona com um desconhecido e não sabe aonde irá.

- Não estou precisando de carona, obrigado.

A pertinência ofusca a piedade. O condutor apalpa a própria bunda:

- Tem certeza? Você não sabe o que está perdendo.

Perdendo tempo, pensei. Responder mais alguma coisa seria partir para a violência. Prossigo na minha caminhada sem dizer mais uma só palavra. O carro parte em alta velocidade. Agora, sim, começo a comer poeira.

Menos de 100 metros depois, ouço um assovio. Era algo familiar, uma música, que sabia ser de algum filme. Procuro institivamente a direção. Parece vir de uma casa de taipa, perto da estrada. Tento a todo custo identificar. Sorrio, pois veio a resposta ao pensamento: "O Dólar Furado"! Era um western a que tinha assistido alguns anos antes. Só não sabia o nome da música. Bem que aquela região seca e poeirenta combinaria com filmes desse estilo. Para completar a cena, talvez tenha faltado apenas um estampido alguns minutos antes...

Finalmente, chego de volta ao acampamento:

- Vocês nem imaginam o que me aconteceu...